Ao fim de pouco mais do que um ano, o Presidente da República, João Lourenço, exonerou Joana Lina do cargo de Governadora da Província de Luanda, nomeando para o cargo Ana Paula Chantre Luna de Carvalho, previamente exonerada do cargo de Secretária de Estado para o Ordenamento do Território.
A meio do mês de Maio, as mais de 8.000 pessoas que ficaram desalojadas em consequências das chuvas torrenciais de Abril, em Luanda, continuavam a aguardar soluções por parte do governo provincial, que estava a “preparar o processo”, segundo disse no dia 11 de Maio a governadora.
Os angolanos estão, ao que parece, muito mal habituados. Tanto o governo do país como o de Luanda não existem para servir a população. A sua principal é função é… servir-se dessa população.
“Tirando algumas iniciativas individuais que foram realizadas, ao nível do Governo Provincial de Luanda (GPL), estamos ainda a preparar o processo, ainda não terminámos”, afirmou Joana Lina, acrescentando que o trabalho terá de ser feito de forma “sistemática, organizada”. Traduzindo, a resolução do problema anda devagar, devagarinho, nos intervalos em que está… parada.
Em 19 de Abril, chuvas torrenciais (não programadas nem autorizadas pelo MPLA e, por isso, atentatórias da segurança do Estado) provocaram o caos em Luanda e deixaram vários mortos e mais de 8.000 pessoas desalojadas e 1.617 “casas” inundadas.
A governadora falava em Luanda à margem de uma cerimónia em que foram transferidas estruturas de gestão territorial, até então geridas por órgãos centrais, para o GPL. Essas estruturas não incluem, é claro, competência, profissionalismo e espírito de missão. São apenas uma forma ancestral de o MPLA trocar seis por meia dúzia.
Questionada sobre os problemas com os semáforos da cidade, muitos dos quais sem funcionar, causando constrangimentos no tráfego, Joana Lima respondeu que o funcionamento da província por vezes “choca” com outros organismos e que as fronteiras relativamente às responsabilidades de gestão nem sempre estão delimitadas. Ou seja, 45 anos depois de chegar ao Poder, o MPLA continua sem saber a diferença entre a casa do fundo e o funda da casa. E quando assim acontece, é normal que a governadora leia as instruções de funcionamento do Governo provincial à noite e recorrendo à luz de um candeeiro apagado.
“Isso provoca alguma confusão, estamos preocupados com isto e com a iluminação pública”, respondeu a governadora, sem fornecer mais detalhes. E respondeu bem. Joana Lina resolveu adoptar a estratégia dos países desenvolvidos que deixam a porta aberta para a competência entrar. Mas como acontece com os que têm o cérebro nos intestinos, baixou uma ordem para que a Berta ficasse à porta. E, assim, em vez de Luanda ter um Governo Provincial passou a ter, desse 1975, um prostíbulo.
Sobre a recolha do lixo, outro problema crítico da capital que há meses preocupava e preocupa os munícipes de Luanda, admitiu que “não está a ser fácil” para as operadoras seleccionadas por concurso, e que iniciaram a limpeza em Abril, devido à existência de grandes focos de lixo ainda espalhados pela cidade. Era mesmo Joana Lina no seu melhor.
No quadro da suposta descentralização e desburocratização do Estado, foram transferidas várias estruturas de gestão territorial urbana, incluindo património e infra-estruturas de vários órgãos centrais para o GPL. Assim, todos juntos, um de cada vez, lá assistimos à peregrinação de governadores e similares incompetentes, convictos de que estão a encontrar o princípio do fim do problema quando, na verdade, estão apenas a encontrar o fim do princípio.
Entre os gabinetes que passaram para o controlo do GPL para posterior (sabe o MPLA quando isso acontecerá) passagem aos municípios, contam-se o gabinete de aproveitamento hidráulico do Kikuxi, o gabinete técnico de conversão urbana do Cazenga, o gabinete de requalificação das cidades do Kilamba, Cacuaco e Camama, bem como algumas reservas fundiárias da Zona Económica Especial e reservas mineiras.
A transferência de competências visa, segundo uma nota do GPL, evitar a sobreposição de tarefas e a necessidade de garantir melhor actuação e melhor prestação de serviços aos cidadãos.
O encanto do lixo e dos grandes lagos
A poluição, o lixo, os grandes lagos, a chuva, a seca, a miséria, a fome, as , estão, cada vez mais, ao nível do seu patrono (o MPLA). O Governo do MPLA (o mesmo desde 1975) anunciou uma “operação de emergência” para limpar o lixo acumulado em Luanda, que envolveria empresas de limpeza e de construção e até as Forças Armadas.
Recorde-se que lançar “operações” faz parte da identidade do MPLA, sendo as operações Resgate e Transparência emblemáticas mas miniaturas daquela que foi e mãe a de todas as históricas operações “made in MPLA”, de seu nome “Operação Massacre”, também conhecida por “Operação Genocídio” ou “Operação 27 de Maio” que, em 1977, provocou sob o comando do hitleriano general Agostinho Neto o assassinato de milhares e milhares de angolanos.
O plano da “operação emergência” foi apresentado, como “manda a sapatilha”, em conferência de imprensa pela ministra de Estado para a Área Social, Carolina Cerqueira, que explicou que a comissão multissectorial (que, na verdade, serviu para mostrar a manifesta e crónica incompetência dos diferentes governadores provinciais do MPLA), foi criada para apoiar o governo de Luanda “visa auxiliar a resolver os problemas inerentes à acumulação recolha e tratamento do lixo, a fim de se evitarem males maiores relacionados com a saúde publica e degradação do ambiente”.
A governante admitiu que o problema que resultou da acumulação de detritos, após a suspensão de contratos com as operadoras de recolha em Dezembro do ano passado, ganhou nova dimensão com as chuvas, e reconheceu que os seus efeitos poderiam ter sido minimizados se tivessem sido adoptadas medidas proactivas adequadas no que respeita à drenagem, controlo de infra-estruturas e controlo de construções anárquicas. Por outras palavras, se o governo do país e da província existissem para servir a população e não – como acontece há 45 anos – para dela se servirem.
“Pagámos um elevado preço por estas incúrias, pois perderam-se várias vidas e muitas famílias viram as suas vidas difíceis degradaram-se”, assinalou Carolina Cerqueira, afirmando que quem “vivia abaixo do limiar da pobreza ficou ainda mais pobre” (antes destas chuvas eram já mais de 20 milhões), o que considerou preocupante e que levou o Governo a procurar “uma solução expedita para ultrapassar no mais curto espaço de tempo a situação anómala” que se vive.
A ministra destacou que a comissão não pretende substituir-se ao governo de Luanda, então liderado por aquela que foi o paradigma da incompetência, Joana Lina, sendo antes “um seu auxiliar, para em conjunto encontrar solução de um problema gravíssimo, específico”.
Os trabalhos vão ser executados por empresas de construção que “voluntariamente se predispuseram a participar na operação de limpeza de grande envergadura” que se inicia na segunda-feira, bem como operadoras com tradição na recolha de lixo e Forças Armadas que, neste caso, acreditam que vão infligir – sob as ordens do general António Egídio de Sousa Santos “Disciplina” – uma monstruosa derrota ao exército inimigo, provavelmente formado por toneladas de lixo… estrangeiro.
O então ministro de Estado e chefe da Casa de (in)Segurança do Presidente da República, general Pedro Sebastião, disse que seriam “movimentados alguns efectivos da guarnição militar de Luanda”.
Quanto às empresas de construção foram mobilizadas 12, segundo o ministro das Obras Públicas e Ordenamento do Território, Manuel Tavares, das quais cinco já iniciaram a “actividade de recolha do passivo de lixo existente”.
Manuel Tavares falou ainda sobre as soluções para a drenagem de Luanda, que envolvem elevados recursos financeiros, anunciando que vai ser feito um projecto de requalificação do rio Cambamba, que envolve 34 quilómetros.
Por outro lado, a ministra da Saúde, Sílvia Lutucuta, admitiu que existiam riscos de cólera na cidade. “Foi para evitar uma crise de saúde pública que se tomaram estas medidas emergenciais”, disse, assegurando que o Governo tem estado a fazer vigilância epidemiológica sem ter nenhum caso notificado até ao momento.
Enquanto governadora, Joana Lina (espécie feminina de João Pinto ou de Luvualu de Carvalho) rejeitou, por seu lado, a anulação do concurso público através do qual foram seleccionadas sete empresas sublinhando que “estão a trabalhar”, embora os efeitos não sejam imediatos, pois “houve um acumular de resíduos”.
Em Fevereiro, o Presidente da República, João Lourenço, aprovou uma despesa de 34,89 mil milhões de kwanzas (44 milhões de euros), para aquisição de serviços de limpeza pública e recolha de resíduos sólidos.
No entanto, apesar de terem sido iniciados os trabalhos no final de Março, continuam a ser visíveis os amontoados de lixo em todas as zonas da província. Aliás, o MPLA tem muito mais encanto quando o Sol bate nas “divinas” montanhas de lixo, funcionando como musas inspiradoras de poetas como Manuel Rui Monteiro.
Folha 8 com Lusa